quinta-feira, agosto 10, 2006

A inteligência no abismo

Escutei duas senhoras conversando no ônibus: aparentemente alguém teria recusado um filho com síndrome de Down, alegando que seria um "estorvo". Aparentemente uma médica teria dado um discurso "lindo" sobre a vida e sobre a importância de aceitar-se um presente de Deus, seja o que for. Isto parece fácil demais com a vida dos outros. Mas é certo que as pessoas precisam aprender a assumir responsabilidades, mas cabe à equipe de saúde auxiliar neste caminho, compreendendo o quanto é difícil, às vezes por razões mais práticas que emocionais: falta de dinheiro e tempo, real.
Mas isto é óbvio demais para ser comentado aqui.
Eu fiquei pensando na minha atitude. Em todas as crianças excepcionais que eu vi. Fiquei pensando o quanto eu odeio crianças. Acho lindo o bebê rosadinho no colo da mãe ou um pequeno ser aprendendo a correr. Nada mais bonito que um sorriso inocente.
Mas o choro faz a minha alma doer de uma forma que eu não consigo controlar, ou sequer entender. O sofrimento infantil me faz perder qualquer resquício de racionalidade. Isto simplesmente não pode acontecer. Odeio crianças. Mais ainda as excepcionais.
Mas mesmo assim eu me vi, Médico de Família e Comunidade me deparando com o problema. Abraçando um excepcional e chamando de "meu amigo". Pura hipocrisia. Não, não posso ser hipócrita. Tenho que ser sincero em meus sentimentos. Este é o meu conflito.
Enquanto eu vejo o abismo eu temo aquilo em que posso me transformar: frio, calculista, cruel, hipócrita - médico. Mas talvez haja uma opção que não seja absorver o abismo, nem desistir de enfrentá-lo: é jogar-se nele. Encarar o sofrimento humano com a coragem que um suicída encara a morte.
Talvez se eu compreendesse o que torna alguém "meu amigo" eu poderia ser menos hipócrita. Talvez eu também compreendesse que não é o processo que me fará médico que me tornará hipócrita e calculista, talvez eu visse assustado que eu sempre fui assim. Só arrumei uma justificativa para deixar isto transparecer.
Gostaria de recuperar a referência, mas foi-se. Eu li um comentário que dizia que desprezar os textes de QI era como jogar o bebê junto com a água que o lavou (uma expressão que os americanos adoram). O problema não é o texto, não é fazê-lo, não é considerá-lo importante e não é nem o fato de usá-lo como uma determinação objetiva da inteligência. O problema é o valor que damos subjetivamente a inteligência. A nossa dificuldade de definí-la e compreendê-la (argumenta) vêm do fato que a consideramos um padrão-ouro do valor do ser-humano. E não simplesmente uma característica própria do indivíduo, como o é a beleza, a honestidade e a coragem.
A inteligência pode ter vantagens para um candidato a amigo. Um discurso interessante e idéias novas que nos fazem pensar podem ser divertidas. Mas a beleza de um comentário inocente também. Se eu procurar o que deve ser importante nas pessoas encontrarei onde eu menos esperaria. Durante este processo que ainda vai durar alguns poucos anos, espero mudar a ponto de ser sincero em meus sentimentos com o feio, o sujo, o pobre e o burro.
O amor me fará aliviar o seu sentimento.
Sid

3 comentários:

Anônimo disse...

Meu amigo, alias não sei se posso te chamar desta forma depois de ter lido o texto, onde expressou seu sentimento a respeito do ser humano.
Algumas pessoas com certeza vão lhe dizer que o passo mais difícil, você acaba de dar, que e a conscientização de seus sentimentos, so que infelizmente não vou falar desta forma, porque você está consciente deste fato a muito tempo e ainda não conseguiu nem uma melhora., Apesar de parabeniza-lo, pela coragem de assumir tal sentimento, o que também é muito difícil.
Alias, se estiver errada, desculpe-me.
De qualquer maneira continuarei meu raciocínio.
Você já amou alguma pessoas neste planeta?, já sentiu a dor e o sofrimento?
Como se seu coração estivesse completamente massacrado, tivesse passado 1 dia inteiro dentro de um liquidificador sendo triturado, misturado, rasgado, cortado em minúsculas partículas e completamente arruinado, de uma forma tão imensa que as vezes chegamos a sentir o gosto de nosso próprio sangue, a ponto de desejar nossa própria morte para conseguir sair deste tormento, desta angustia que esta nos consumindo.
Você é capaz de sentir algum amor?,
Eu particularmente acho que algumas pessoas aprendem a valorizar o ser humana depois de passar pelo sofrimento real, algumas pessoas são mais sensíveis e conseguem atingir a beleza do coração e da alma desde o momento de sua concepção, quando surge o primeiro cristal, a luz da vida, nascimento, mais de qualquer forma o momento do conhecimento não vem ao caso, so queremos chegar ate o sentimento de é hipocrisia, que deve ser o pior dos sentimentos.
Se você não sabe o significado do amor, se não nasceu com o dom do amor, talvez so poderá a aceitar seus
pacientes e abraça-los realmente, sentindo ternura e carinho, mesmo que o mesmo tenha síndrome de Down, creio que so aprendera se passar por alguma trituração de sua alma, ou se surgir em sua vida um anjo mulher “ou homem”, isto também não vem ao caso, um anjo luz poderá te ajudar, um anjo da paz e da misericórdia.
Não estou dando lição de moral, alias quem sou eu para atirar uma pedra em alguém.
De qualquer forma pode ter certeza, que a hora esta para chegar e você conseguira enxerga o mundo e o ser humano de outra forma, pode ter certeza que “estorvos” são alguns sentimentos que nos incomoda, como este que você e trilhões de outras pessoas também sentem.
As pessoas que nasceram com síndrome de Downs e mesmo as crianças, são luzis radiantes, com a energia tão pura e maravilhosa que podem mudar e transformar brejo em água límpida.
Se você não conseguir a transformação natural e se o seu anjo não aparecer, realmente, seu coração terá de passar por alguma trituração com extrema dor, para iluminar sua alma.
Pode ter certeza que estarei pedindo a Deus para te iluminar e que você consiga ver a luz sem passar por sofrimentos.
Espero que seja muito feliz.

Anônimo disse...

Ola Sid.

Sou psicologa e estou me especializando para atuar na area de saude, em busca de oportunidades! ( se souber de algo?? rsrs).
Adorei seus textos, e me comprometi em ler sempre! Continue escrevendo suas experiencias e tenho certeza que se tornara um profissional responsavel por seres humanos e nao por doencas apenas.

Roberta Mello
Psicologa
robertammello@yahoo.com.br

Anônimo disse...

-Cara, sou médico também...
-Sua sede de ser sincero é patética. Você além de fazer uma grande anti-propaganda, faz-se como um profeta, alguém que veio para revelar a "verdade" que existe atrás da medicina. É contrangedor ver num portugês tão tacanho as expressões pré-adolescentes de um jovem médico frustrado. Sua decepções, seus medos, suas reles fraquezas, sua imaturidade, seu desequilíbrio e falta de raciocínio judicioso, bom senso e humanidade são revelados a cada linha destes textos. Vc parece fazer uma alta-piedade-terapia neste blog. Vc não só se diz, como parece pretender ser medíocre como médico, mas não, vc não está feliz... com esforço parece tentar ser um pior humano. Fico espantado como vc tem o mau hábito de responder as críticas mais lúcidas com escárnio... vc, um moleque, se vê como um Deus sendo médico... que merda ! Cara, vc é pior do que as sujeiras que vc tanto narra nestas "crônicas" escatológicas. Vc fez prova de redação no vestibular ?? Como passou ???... Sinceramente, acho que vc não deveria me responder. Pensar já seria o bastante...
Alberto